domingo, abril 30

As minhas músicas (I)

Vou iniciar com este post a colocação de algumas músicas do meu gosto pessoal. Não vou apresentá-las por ordem de gosto. Vão saindo um pouco aleatóriamente. Uma outra pode evidenciar, nesse dia, o meu estado de alma. As músicas e os cantores serão de lingua portuguesa. Hoje começo com a Adriana Calcanhoto, uma cantora, que não descobri há muito tempo, mas que tem uma bela voz e canções de muito bom gosto. Gosto muito desta.

Senhas

Eu não gosto do bom gosto
Eu não gosto de bom senso
Eu não gosto de bons modos

Não gosto

Eu aguento até rigores
Eu não tenho pena dos traídos
Eu hospedo infractores e banidos
Eu respeito conveniências
Eu não ligo pra conchavos
Eu suporto aparências
Eu não gosto de maus tratos

Mas o que eu não gosto é do bom gosto
Eu não gosto de bom senso
Eu não gosto de bons modos

Não gosto

Eu aguento até os modernos
E seus segundos cadernos
Eu aguento até os caretas
E suas verdades perfeitas

O que eu não gosto é do bom gosto
Eu não gosto de bom senso
Eu não gosto de bons modos

Não gosto

Eu aguento até os estetas
Eu não julgo a competência
Eu não ligo para etiqueta
Eu aplaudo rebeldias
Eu respeito tiranias
Eu compreendo piedades
Eu não condeno mentiras
Eu não condeno vaidades

O que eu não gosto é do bom gosto
Eu não gosto do bom senso
Eu não gosto de bons modos

Não gosto

Eu gosto dos que têm fome
Dos que morrem de vontade
Dos que secam de desejo
Dos que ardem…


Adriana Calcanhoto


sábado, abril 29

Não é preciso fazer um desenho

Hoje fui à praia. Terça-Feira, vou-me inscrever num ginásio.

Um governo de chacha

O primeiro-ministro, em boa hora, quis debater a sustentabilidade da segurança social.

Já não era sem tempo. Infelizmente não trouxe propostas sérias. Mais do mesmo. Aumento da contribuição individual. Ou trabalhar até mais tarde, como contrapartida de não descontar mais.

Na prática, a proposta fica reduzida a descontar mais. Trabalhar, depois dos 65 anos (quando nem as empresas estão nisso interessadas), não vai acontecer. Portanto, descontar mais para a Segurança Social que hoje é de 11 por cento é a proposta de Sócrates. O resto é folclore.

Incentivos à natalidade, às famílias mono parentais, são bagatelas, para entreter. Estou mesmo a ver as famílias a correr a ter mais filhos para ter uma ligeira baixa na taxa social única.

A indexação da reforma à esperança de vida, significa, receber menos, ao fim da idade legal da reforma aos 65 anos e a descontar mais enquanto está no activo. Não estou a ver as pessoas a trabalhar até aos setenta ou mais anos de idade... e as empresas satisfeitas com a "experiência e a sabedoria dos mais velhos" a ocupar tranquilamente os seus postos de trabalho.

Por cada década, segundo estes cálculos, a esperança de vida sobe um 1 ano. O que significa que quem está a 10 anos da reforma, nessa altura a sua pensão será reduzida em mais 5 por cento (o chamado factor de sustentabilidade) a não ser que queira trabalhar mais (está-se mesmo a ver não é?) ou aumentar a sua prestação social para um valor acima dos tais 11 por cento. Quanto ainda não dizem!

O governo, pretende igualmente, reformular o cálculo da reforma e mudar a regra em vigor, em que o valor da reforma deixa de ser oitenta por cento, da média dos melhores dez anos dos últimos quinze anos de trabalho, para ser a média de toda a carreira contributiva. Está-se mesmo a ver... uma significativa redução do valor de pensão face ao que está em vigor. O Governo não nos diz quanto. Pelas contas do deputado Francisco Louçã a redução é de cerca de vinte por cento. O governo diz que não sabe. Também não lhe importa fazer essas contas. Eu vi o ministro do Trabalho e da Segurança Social, Vieira da Silva, quando confrontado com esta questão pelo jornalista Pedro Camacho na TVI, a gaguejar e a não ser capaz de adiantar um número. É assim esta gente, diminuir as retribuições aos trabalhadores, no fim da vida activa de trabalho (quanto? que lhes importa!...) e obrigá-los a descontar mais enquanto trabalham.

Esta reforma é pois um Flop em minha opinião. E como sempre, atiram para os trabalhadores a responsabilidade maior de resolver a incapacidade dos nossos governantes em encontrar soluções, sérias, responsáveis e compartilhadas, tendo em conta as possibilidades de cada um. Nesta proposta não é pedido nenhum esforço aos mais ricos e às empresas. O governo, este e os anteriores, não encontram melhores soluções que não sejam carregar os mesmos, com as dificuldades. Enquanto isso os ricos e os poderosos, continuam a viver à grande e “à francesa”. Não nos admiremos... eles são uns cobardes e subservientes, perante os grandes.

A situação da sustentabilidade da segurança social não é fácil e requer o empenhamento de todos.

Mas o Governo não tem (ou não quer ter), criatividade, competência e capacidade para resolver o problema e envolver todos, neste esforço, que não só os trabalhadores.


Não se percebe, por exemplo, que o Governo continue a não transferir os dinheiros descontados, mensalmente, pelos trabalhadores e pelas empresas, para a Segurança Social, para pagar o sistema não contributivo ou de acção social, ou para o Fundo de Estabilização;

Não se percebe porque não se alteram as regras de financiamento das empresas, para a Segurança Social, não em função do número de trabalhadores (que acaba por penalizar as empresas que tem mais mão-de-obra), mas sim em função do valor acrescentado bruto;

Não se percebe porque não é vertido uma parte do aumento do IVA (de 19 para 21%) para o fundo de estabilização financeira da Segurança Social;

Não se percebe porque o fundo de capitalização não capitalizou até agora nada, nem o que se pretende fazer;

Não se percebe porque não é criado de um fundo de solidariedade a executar sobre as grandes fortunas e os capitais transaccionados em Bolsa a exemplo do que acontece noutros países;

Não se percebe porque não se produz uma reforma profunda da máquina fiscal para atacar a fuga e a fraude fiscal;

Não se percebe porque não se aposta mais em politicas emprego;

Não se percebe porque não se regularizam a situação dos imigrantes, pondo-os a descontar;

Não se percebe porque não é feita uma auditorias aos serviços de Estado para eliminar com os desperdícios e a má gestão;

Não se percebe porque não se elabora um orçamento de base zero, para avaliar, com rigor, as necessidades dos serviços, em vez de aumentar ou restringir, sem consistência o orçamento, às cegas.

E por aqui me fico… até ver.

sexta-feira, abril 28

Privatização chega à prisão!


Até já imagino estas três prisões em lugares tão inacessíveis como o actual Estabelecimento Prisional da Carregueira, em que, se passar pela cabeça de alguém deslocar-se lá sem ser de veículo automóvel, chegar a tão fatídico lugar constitui uma pena quase tão pesada como a de prisão. Por outro lado quem tem necessidade de recorrer aos transportes públicos, com toda a certeza retirará uma boa fatia do seu orçamento mensal para o efeito.

Se não tivesse presenciado as condições dadas às visitas desses presos, diria que
houve uma mutação radical na população prisional ao ponto de a mesma ser constituída pelos mais ricos e abastados. Dá dó ver as condições de espera em que as mesmas se encontram: ou na fila a derreter ao sol ou então a tomar um bom banho de chuva. Mas como diz o ministro Alberto Costa:“Não faz qualquer sentido onerar o espaço urbano com a função prisional” e o resto que se lixe!

Quanto à questão da entrega ao sector privado de algumas das funções da Guarda Prisional, só a vejo viável caso haja uma revolução na lei de segurança privada que permita dar aos vigilantes as condições para que cumpram tal tarefa. Pois se por um lado lhes está vedado o uso de qualquer tipo de arma, nomeadamente o bastão, única utilizada dentro dos Estabelecimentos Prisionais, por outro lado é sabido que quando se lhes impõe “actuar”, resta a esses vigilantes socorrerem-se das forças públicas de segurança, em geral da PSP.

Mas se as três das maiores empresas de segurança a operar no mercado português -Securitas, Prosegur e Esegur - já se disponibilizaram para assegurar alguns dos serviços de vigilância realizados actualmente pelos guardas prisionais, é porque vêm na medida uma oportunidade de negócio, o mesmo será dizer de obter lucro.

Com a excepção de mero cobrador de impostos, é patente que mais uma vez o Estado se afasta das funções que originariamente lhe estavam cometidas, como é por exemplo o caso dos cuidados de saúde. Se esse alheamento não tem implicado necessariamente a prestação dum melhor serviço ao consumidor, afinal que lucro temos nós contribuintes com toda esta onda de privatizações?

Cris

O nível de incompetência

Eu acho os nossos governantes e grande parte dos nossos políticos horríveis, mesmo abomináveis. Não são sérios. São subservientes perante os mais fortes. São arrogantes com os mais fracos. São mentirosos, oportunistas, interesseiros, carreiristas. Na oposição, são uma coisa, no governo são outra. Na oposição, adjectivam os governantes do pior. No governo, recebem os mesmos adjectivos. Um ciclo vicioso e vergonhoso.

A acusação de “insensibilidade social” tem estado no topo da lista. Ouvimos Sócrates dizer isso, na oposição, ouvimos Marques Mendes, na oposição, dizer o mesmo. E ambos têm razão. As acusações são inteiramente justas.

O que significa que onde eles estão bem e dizem umas coisas interessantes é na oposição.

Ó meu povo! Já ouviram falar no princípio de Peter? É o que Peter designa por "nível de incompetência" – o grau a partir do qual as pessoas já não possuem competências para a posição que ocupam. A sua competência é na oposição. Acima desse patamar são incompetentes. Portanto sendo bons na oposição, deixem-nos lá estar. Façam-nos esse favor.

Não se olhe para a política como se olha para o clube de futebol, faz favor… O clube é intocável. É paixão, emoção, sentimento. Já governar, mexe com as nossas vidas, com o nosso bem-estar, com a justiça, a saúde, com as desigualdades sociais.

Não estará na altura de dar o murro na mesa e correr com estes políticos? Não será altura de apostar noutras políticas e políticos?


"Ai que prazer não cumprir um dever"

"Grassa o populismo. E os deputados são humanos", disse Jorge Coelho.

- Cala-te Coelhote, não digas asneiras...

quinta-feira, abril 27

"Quem te disse ao ouvido esse segredo"

«A razão porque Marques Mendes e Ribeiro e Castro não têm ninguém que os defronte em Congresso é porque quem verdadeiramente os defrontaria está impedido de o fazer porque é primeiro-ministro», afirmou Francisco Louçã.

- Dá-lhes forte Chico...

Assombro

Às vezes,
pequenos grandes terramotos

ocorrem do lado esquerdo
do meu peito.


Fora,
não se dão conta os desatentos.
(...)

Os mais íntimos
Já me viram remexendo escombros

Em mim há algo imóvel e soterrado
em permanente assombro.

Affonso Romano de Sant'Ana


Portugal em primeiro lugar

em termos de desigualdade do rendimento e com maior desigualdade após a distribuição dos apoios estatais."

Há notícias que merecem poucos comentários. Um título de jornal às vezes não é suficiente. Não é preciso acrescentar quase nada.

Apenas quero salientar a hipocrisia e o nojo que sinto a ouvir ou ler, certas pessoas, geralmente, muito inteligentes e com muitas propostas para o país; economistas de profissão, gestores públicos ou privados, empresários bem sucedidos, deputados, políticos, jornalistas e comentadores de uma nova geração da direita, também políticos de uma falsa esquerda, os nossos governantes, os de ontem e os de hoje, algumas pessoas, bem sucedidas e bem instaladas, ou outras, por ignorância ou estupidez, não se cansam de apregoar, que Portugal, alimenta a preguiça, dá demasiada protecção aos pobres, aos desempregados, aos reformados e que gasta demasiado na segurança social, com os “desafortunados” da vida.

O estudo da Eurostat não mente.
A prestação social de Portugal para os que estão em risco de pobreza é das mais baixas na Europa o que torna o país mais desigual após a distribuição dos apoios estatais.

Como ter paciência para ouvir certa gente?

quarta-feira, abril 26

Foi bonita a festa pá / já murcharam tua festa pá

Hoje seria um tempo de comentar a intervenção de Cavaco Silva. Não sou capaz. Também não o ouvi, andei noutras festas de Abril. Não sou capaz porque não acredito no homem. A festa já passou, deixo-vos com a música do Chico Buarque e estes versos:

Foi bonita a festa, pá
fiquei contente
'inda guardo renitente, um velho cravo para mim

Já murcharam tua festa, pá
mas, certamente
esqueceram uma semente nalgum canto de jardim



PS. Olhem aqui abaixo deste, está um post muito bonito de Álvaro. Façam favor de ler que vale a pena.

terça-feira, abril 25

Coisas sérias e banais

A vida corre plena de promoções e banalidades. É a promoção das imobiliárias com os ricos a comprar o que os pobres estão a vender, é a promoção dos carros, muitos carros para todos os gostos, é a promoção exagerada de electrodomésticos que não sei se para todos os gostos, com micro ondas ao preço de cinco euros, para lançar fora no dia seguinte, é a promoção dos mais luxuosos casacos de pele, e o animal que ficou sem pele que se lixe, importa é ter um outro animal com a bolsa cheia de euros para comprar casacos de pele e de pelo. Enfim, é uma festa, a festa da concorrência desleal, em que cada um refila ao expor e promover o melhor e nunca o pior, o mais eficaz e nunca o mais garantido, tudo tão espectacularmente apregoado como se fosse o detergente a lavar mais branco. Oh, meu deus, e quantas vezes tudo acaba por ser tão enigmaticamente sujo!

Daí todos comungar da afirmação em fazer o impossível para melhor servir o cidadão, já que o possível não são capazes de fazer, nunca o quiseram fazer, mas dizem que sim, que são os melhores do mundo, e que só não fazem mais porque não os deixam... como os nossos deputados comuns acusados de abandonar o parlamento para gozo dumas férias pela páscoa e ter agora a maçada de forjar uma desculpa pelas faltas. Eles, coitados, vítimas sim senhor de exploração no trabalho político forçado que faz doer os cotovelos e provoca uma danada comichão na cabeça...

Ora essa!... não pensem que os ilustríssimos passam a vida a trautear cantigas para embalar português. Nem pensem que têm assim tanta falta de visão que os não conduza a fugas a debates e votações parlamentares. Tão-pouco pensem que os interesses que defendem não vão direitinhos para uns tantos Belmiros de Azevedo a quem o diabo havia de tentar numa reles subjugação ao capital estrangeiro para lançar OPAs sobre a PT e BPI. Não. É o sistema, meus senhores, este selvático sistema, por eles estabelecido, em que se dá primazia aos números e se esquecem as pessoas. Isso mesmo, este terrível sistema (que são eles) que leva os ricos a crucificar os pobres.

Bom, de Espanha, entretanto, chega-me um CD de Paco de Lucía “Cositas Buenas “, que coloco no leitor e perco-me nos acordes desta música sem esquecer as editoras e livreiros às cabeçadas com o ministério por causa dos livros escolares. Que pena! Logo neste tempo em que tão didacticamente se preocupam com livros que pegaram moda, por onde abundam livros de jogadores, de directores, de treinadores de futebol e de tudo que acaba em dores, horrores e fedores. Pois sim senhor, é o que mais se vende e o que mais rende. Porque este mundo gira muito bem em redor do futebol, das celebridades e das banalidades, e, por este andar, já o disse e repito, não tarda que apareça nas bancas um livro da autoria de Bush com a biografia de Bin Laden ou este a elogiar aquele, porque ambos têm interesses que envolve biliões de dólares. É o que se vende... sem vergonha nem peçonha, satisfazendo falsas rivalidades e enormidades, e a guerra que se lixe como se lixaram os milhares de homens e mulheres que no Afeganistão e no Iraque já morreram.

Fico-me fora do sistema, principalmente fora daquelas superfícies onde tudo se impinge e não há sequer um WC para serviço público onde se possa fazer uma mija, com culpas para a entidade que passa licenças sem vistoria, o que é uma vergonha nesta terra. Onde é que já escrevi isto?

Mas vergonha perderá qualquer escriba, um dia a sofrer de prostatite e a procurar dar uma valente regadela por detrás dum frigorífico ou máquina de lavar. Bem feito, e digno de aplauso. E demais a mais eu que já fui tentado a fazê-lo. Só que, enfim... razões de ética e bom senso.

Fico-me pelos livros com cheiro a nafta, ouvindo estes acordes flamencos de Paco de Lucía, sem palmas nem sapateado, para dar brilho à minha biblioteca nestas sublimes e silenciosas tardes de Abril. É então que leio um poema de Carlos de Oliveira, um conto de Manuel da Fonseca, um romance de Mário Cláudio, estes agora com sabor a mar e a literatura, numa grata duplicidade de beleza e sonho, cuidadosamente assumida no arco das palavras que dia a dia vamos desenhando.

Álvaro de Oliveira

Também, publicada no Correio do Minho de 24.04.2006

Um poema por dia de Alfredo Reguengo ( XIII)

(Clique para aumentar a imagem)


IF...

Se agora fosse
o dia
que não veio
e eu, fosse, ainda,
o mesmo
que não sou,
seria a madrugada,
apenas,
um anseio
dum sonho
morto a meio
que o pôr do sol
sonhou...

Alfredo Reguengo
(inédito)
08/04/1974


(pois é... sou mesmo eu a ler uma poesia de Alfrego Reguengo aí pelas 4,00h da madrugada de ontem [hoje] - Uma noite de sons, de imagens e memórias de mais de uma centenas de pessoas)

O 100 de Abril e Salgueiro Maia


As minhas actividades políticas começaram cedo. Por isso, desde cedo comecei a frequentar os cafés onde, em Santarém, se reunia a esquerda da terra. No saudoso café “Brasileira”, situado no Largo do Seminário, juntava-se a esquerda florida, ou melhor, toda a esquerda.

Ali arrumávamos as lutas locais e discutíamos acaloradamente a política nacional. Ali conheci várias figuras, entre elas Salgueiro Maia.

No “Brasileira” juntavam-se também muitos dos membros da comissão das comemorações populares do 25 de Abril. Esta comissão organizava iniciativas comemorativas várias e depois da morte de Maia organizou várias homenagens e romagens a Castelo de Vide.

Desse tempo recordo duas histórias.

A primeira passou-se com Salgueiro Maia. Numa conversa, em grupo alargado, Maia contou que durante um combate na Guiné, se a memória não me falha, as tropas portuguesas repeliram um ataque das tropas de libertação. Vendo rastos de sangue no chão as tropas de Maia seguiram os rastos. Até que, vários quilómetros à frente, encontra um soldado autóctone morto segurando, com as mãos em concha, as tripas que lhe caiam do corpo aberto. Mais tarde, Maia percebeu que o soldado, prevendo que ia morrer, percorreu o caminho inverso ao da sua base para afastar dela as tropas portuguesas. Maia relatava esse facto como tendo sido um marco na sua tomada de consciência.

Já depois da morte de Maia, numa outra conversa, alguém contava como Maia dava conta do seu desgosto com o caminho do país. E que este terá dito “isto agora já não vai com um 25 de Abril, nem com um 50 de Abril ou um 75 de Abril, isto agora, só lá vai com um 100 de Abril”.


Quando ouvimos as notícias que aumentaram os pobres em Portugal e que os gestores das empresas cotadas no PSI 20 ganham 486 mil euros por ano só posso concordar com Salgueiro Maia. Isto agora só lá vai com um 100 de Abril.

O problema é que o povo tem que perceber e acreditar nisso. E heróis teremos que ser todos nós!

Victor Franco

segunda-feira, abril 24

Há sempre qualquer coisa que eu tenho que fazer



Inquietação, é uma música de José Mário Branco sempre presente, "porquê não sei". Ainda...

A contas com o bem que tu me fazes
A contas com o mal por que passei
Com tantas guerras que travei
Já não sei fazer as pazes

São flores aos milhões entre ruínas
Meu peito feito campo de batalha
Cada alvorada que me ensinas
Oiro em pó que o vento espalha

Cá dentro inquietação, inquietação
É só inquietação, inquietação
Porquê, não sei
Porquê, não sei
Porquê, não sei ainda

Há sempre qualquer coisa que está pra acontecer
Qualquer coisa que eu devia perceber
Porquê, não sei
Porquê, não sei
Porquê, não sei ainda

Ensinas-me fazer tantas perguntas
Na volta das respostas que eu trazia
Quantas promessas eu faria
Se as cumprisse todas juntas

Não largues esta mão no torvelinho
Pois falta sempre pouco para chegar
Eu não meti o barco ao mar
Pra ficar pelo caminho

Cá dentro inqueitação, inquietação
É só inquietação, inquietação
Porquê, não sei
Porquê, não sei
Porquê, não sei ainda

Há sempre qualquer coisa que está pra acontecer
Qualquer coisa que eu devia perceber
Porquê, não sei
Porquê, não sei
Porquê, não sei ainda

Cá dentro inqueitação, inquietação
É só inquietação, inquietação
Porquê, não sei
Mas sei
É que não sei ainda

Há sempre qualquer coisa que eu tenho que fazer
Qualquer coisa que eu devia resolver
Porquê, não sei
Mas sei
Que essa coisa é que é linda

José Mário Branco

A madrugada de Abril


Hoje decidi colocar aqui a imagem de um autocolante de Otelo Saraiva de Carvalho, lançado por altura da sua primeira candidatura a Presidente da República. Foi um autocolante que saiu com defeito.

O percurso de Otelo, pós 25 de Abril, também foi tortuoso, como foi o de muitos de nós, empenhados que estavamos em garantir as liberdades e impedir que o fascismo voltasse. Otelo, cometeu muitos erros, sem qualquer dúvida, mas era um homem, entregue à causa das liberdades, de forma generosa e empenhada.

Com o fim do movimento de unidade popular (MUP) abandonei os GDUPs num "congresso" no Palácio de Cristal no Porto. Por essa altura, como membro da Comissão Distrital e na sequência de uma manifestação a exigir a libertação de Otelo, que tinha sido preso, fomos, todos os dirigentes do movimento em Viana do Castelo, processados pelo Governador Civil e pela primeira vez e até hoje única, sentei-me no banco de um tribunal. Acabamos por ser condenados a dois anos de prisão, com suspensão da pena.


Para mim, Otelo Saraiva de Carvalho, foi e ainda é hoje, o maior símbolo vivo do 25 de Abril.


Este ano, como habitualmente vou ao almoço de comemoração do 25 de Abril e vou estar presente, na primeira iniciativa de um grupo de cidadãos "Madrugada de Abril" no Café-Teatro, numa Ceia: Abril de novo - memórias, sons e imagens de uma noite. Espero que seja uma noite bem passada, numa tertúlia entre homens de Abril e filhos de Abril que vai decorrer, entre as 0:00h e as 4:00h.

25 de Abril, sempre!

Um poema por dia de Alfredo Reguengo ( XII )


Alarme

Quem foi que anoiteceu a tarde em água e vento
e encheu de Inverno o Outono em que me escondo?
Quem foi que amarfanhou o meu sorriso antigo
e encheu de lama estrelas que sonhava?

Vontade de escarrar,
vontade louca
de dizer palavrões
a toda a gente!...
E tudo fica igual,
como se nada
tivesse acontecido
em qualquer parte;
e tudo fica mudo,
a mastigar
pra dentro
os palavrões
que era
preciso
dizer,
para que a tarde
fosse tarde
e o Outono
Outono
e o riso fosse riso
-um bimbalhar de sinos-
e as estrelas
brilhassem como sóis...

É preciso
acordar
a madrugada
-antes que a matem,
inda mal desperta!...

Alfredo Reguengo
05/12/196

domingo, abril 23

Ora aí está uma coisa que não sabia.

Segundo o Correio da manhã, a UGT vai propôr que as "pontes" sejam consideradas dias de férias. Estou espantado. Semprei achei que alguém que metesse uma "ponte" lhe fosse descontado um dia de férias ou um dia de salário.

As pontes existem, não se podem fugir a elas e não encontro nenhum mal nisso. Não percebo esta proposta da UGT. O gozo de férias nas empresas privadas é feito, por acordo, logo, quando algum trabalhador mete uma ponte (que lhe custa um dia de férias) foi com o consentimento, o conhecimento e resulta do acordo, atempadamente, celebrado, entre as partes.

O problema é outro. Não são as pontes. São as tolerâncias de ponto que apenas beneficiam os funcionários públicos (e sobre isso, só há um responsável; o Governo) e o excesso de feriados nacionais.

Tirando casos, excepcionalíssimos, as tolerâncias de ponte deviam ser evitadas. No caso dos feriados, admito que poderiam se cortar alguns, especialmente, certos feriados religiosos..., mas haverá alguém com coragem para isso?

O que não fará, de todo sentido, é passar os feriados, para as segundas ou sextas para acabar com as ditas pontes, como pretendiam Cavaco Silva e depois Bagão Félix. Há datas que pelo seu significado histórico nunca poderão ser "festejadas" noutras alturas, como o 25 de Abril, 1º de Maio, 10 de Junho, e outros.

Agora, se quiserem, acabem com alguns feriados religiosos e diminuam as tolerâncias de ponto. O resto é para enganar tolos. O exemplo das faltas e das "saída prematuras" dos deputados, vem mostrar quem é beneficiado com as tolerâncias, as pontes, certos feriados.

Um poema por dia de Alfredo Reguengo (XI)


Mensagem

Se eu não voltar,
amor,
não me lamentes,
nem chores
por mim...

Se eu não voltar...
-Barco encalhado,
não!
-antes
barco
perdido
e que não volta
mais
ao porto de armamentos!...

Não me lamentes;
Faz de conta
que eu volto
qualquer dia
e que me esperas
no cais
-no cais moreno
dos teus braços
abertos
e na Senhora da Agonia
dos teus olhos
afogados
de saudade...

Nem chores
por mim,
amor.
Faz de conta
que eu fui
a um mar distante,
onde há pérolas
feitas de lágrimas
que já choraste
por mim
e vou voltar
para te pôr
ao peito
uma saudade
com milhões de pérolas...

E levar-te comigo
em meu veleiro
antigo,
desafiando
ventos
e procelas,

para além
de todas as linhas
de horizontes
vísiveis
ou sonhados,
onde o silêncio
nos curva
e nos envolva
como um sudário
de bruma
e nós sejamos

vontade
de
dormir!...

Se eu não voltar...
Se eu não
voltar,
amor,
não me procures
na linha do horizonte
-que eu ando a navegar
no fundo
dos
teus
olhos...
-e o leme se quebrou
e o velame
são farrapos
a drapejar
no escuro ...

Alfredo Reguengo
31/12 1971


sábado, abril 22

A crise e a OCDE

A Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Económico (OCDE), publicou um relatório sobre Portugal onde confirma as piores notícias. Se por um lado confirma a contínua divergência entre a previsão do crescimento do Produto Interno Bruto português 1,4% e o da Zona Euro 1,8%, por outro confirma a queda do PIB nestes últimos 5 anos em 0,1% enquanto a Zona Euro crescia 0,9%.

A organização sedeada em Paris faz jus aos seus pergaminhos de defensora da economia de mercado e reforça as posições mais conservadoras que, em Portugal, continuam a achar que a política do governo ainda é tímida.

A OCDE defende, no seu relatório, o aumento da idade de reforma, o aumento das contribuições mas a diminuição das prestações, o aumento das propinas, o aumento das facilidades no despedimento, a simplificação dos impostos (deve querer dizer imposto a percentagem de valor único)…

Bénédicte Larre, a lauta economista da OCDE que acompanha a economia portuguesa, criticou ainda a nova classe de IRS de 42% porque “complica o sistema e cria um desincentivo adicional para trabalhar”. Ora tendo este escalão sido criado para os rendimentos mais altos de todos, os superiores a 60.000 € anuais, a senhora Larre está a dizer que os mais ricos são os que trabalham e que os mais ricos devem pagar menos impostos.

Está certo – aos que ganham 4.000 euros anuais a senhora acha que se deve impor contenção salarial. Ora aí está!


Na mesma linha tem estado o “socialista” Vítor Constâncio. O homem que ganha, consta-se, pelo menos 25.000 € mês há anos que pressiona pela contenção salarial dos que ganham o salário mínimo, 385 €.

José Miguel Júdice, homem de profícua prosápia, também lá vem dizendo que realmente se “acabaram os tempos dos empregos para toda a vida, do Estado-providência, do 13.º mês, do subsídio de férias, da reforma aos 55 anos, do absentismo laboral, da baixa por doença sempre que dá jeito, do faz de conta que estou a trabalhar…” mas diz “para que não seja mal citado sou pessoalmente favorável à maior parte destas aquisições sociais…”. Lendo mais à frente, lá vem que “temos que trabalhar mais por menos dinheiro, temos de nos reformar mais tarde e com menos vantagens” e por aí fora[1]. Júdice reconhece que agora há a “coragem de enfrentar de enfrentar os privilégios incomportáveis do funcionalismo público, que Sócrates – honra lhe seja feita – está a tentar reduzir para limites mais admissíveis”. Entre encómios a Sócrates fica a crítica à “esquizofrenia” da direita.

Realmente é verdade. Dificilmente a direita, aquela que oficialmente diz ser, conseguiria fazer melhor. E com apoio popular nas sondagens.

Victor Franco

Um poema por dia de Alfredo Reguengo (X)



Falar

Escrevo
como sei
e como
sinto;
nada oculto,
nem minto;
não me fico
calado;
não engano
ninguém.

Digo
o que tenho
a dizer
(conforme o posso
dizer...)

Os meus poemas
são
a minha voz,
não tem
mistério
-são
um recado
sério.

Não são para adivinhar,
são
para escutar
e compreender.

Ao lê-los
ninguém
pode
entendê-los
de duas maneiras
diferentes
(eles são
o que sinto,
o que tu sentes
-se és
vivo
e queres
continuar
a viver),
nem buscar
no que
digo
-ou para lá
do que digo-
coisas
que
não
quisesse
dizer.

Eu não me calo,
eu falo
sem mentir;
digo
-e digo
com
calor-
para vós,
para comunicar.

Eu não
falo
por
falar.

Eu sigo
-eu vou
para onde for,
para
onde
tenha
de
ir!

Alfredo Reguengo
12/11/1970

sexta-feira, abril 21

Um poema por dia de Alfredo Reguengo (IX)

Povo

Povo que sofres
e cantas,
que te humilhas
e levantas,
que rezas
e que praguejas:
povo cobarde
e sublime,
que se emporcalha
e redime,
-oh! povo, bendito sejas!...

Alfredo Reguengo
11/04/1974

Deputado propôs pedido de desculpas

Não lhes ficaria nada mal... mas sem artificios. Pisgaram-se e devem assumir a responsabilidade. Mas quando a seguir, lemos que dois deputados do PSD insultam-se e estão acusados de estarem a receber ajudas de custo indevidas, por viagens que nunca fizeram, talvez não valha mesmo a pena... Não iriamos acreditar na sinceridade deles.

Juiz do Supremo quis absolver mãe de Joana

É a distância da justiça, entre a liberdade e ficar 20 ou 16 anos de prisão ou em países onde existe a pena de morte, entre a morte e a liberdade. Para reflectir.

quinta-feira, abril 20

Legalização de tod@s @s imigrantes

Freitas do Amaral foi a Cabo Verde. Num país de gente pobre e caminhos de terra vermelha sentiu o cetim do luxo hoteleiro e a delicadeza de seus trabalhadores. Alguém deve ter lembrado a Freitas que tinha parentes trabalhando em Portugal. Alguém lhe falou de alguma irmã que saía de casa às 6 da manhã para trabalhar em limpezas e regressava às 9 ou 10 da noite quando os filhos já berravam de fome. Alguém lhe falou de um qualquer primo explorado pelos patrões da construção civil, trabalhando, clandestinamente, o dobro do tempo pela metade do salário.
Alguém lhe falou, não sei se uma empregada do hotel se um governante.

Freitas comoveu-se. É compreensível, o homem não é de ferro. E Freitas deve ter telefonado a Sócrates. Está, está lá, … sim… Sócrates…
Sócrates não se comoveu, percebeu que tinha ali uma oportunidade de dividir as comunidades de imigrantes – agora que precisava de tornar pública a sua proposta de lei de imigração. Sócrates sabia que ia dar um ar de esquerda com uma promessa de uma mão ainda cheia de nada. Sócrates percebeu que os cabo-verdianos iriam adorar mas que os outros iriam perguntar, então e nós?
Vós? Talvez mandando Freitas para a Guiné, Angola, S. Tomé, Ucrânia, Roménia…

Os cabo-verdianos não têm que ter um acto caridoso e uma condescendência. Eles não têm que ter mais direitos que os outros imigrantes – eles têm que ter direitos iguais. E todos – todos têm direito a todos os direitos. A legalização dos imigrantes cabo-verdianos não é um favor que se lhes faz, é um dever de responsabilidade, de respeito pela vida humana. A solução é dizer que somos todos cabo-verdianos. Todos têm que estar legais. Todos somos seres humanos.

Victor Franco

Um poema por dia de Alfredo Reguengo (VIII)

Criancices...

Vejo brincar, ao longe, os meninos bem vestidos
sobre o tapete relvado do jardim.
Tantos brinquedos,
tantos
-santo Deus!-
tantos brinquedos caros,
que seria preciso deixar-mos de comer em casa. muitos dias
para se comprar um
apenas,
certamente!...

Os brinquedos de corda, têm vida,
bricam sozinhos,
basta, apenas, fazer frrr... frrr... num parafuso, ao lado!
E as grandes bonecas vestidas de seda
(da cor das asa das borboletas),
dizem Mamã,
Papá
e mexem os olhos como pessoas vivas...

E eu, e eu
-eu sou nós todos!-
nunca brinquei ali, na relava fofa do jardim florido,
que o polícia não deixa andar garotos,
porque o jardim é público
- e público quer dizer:de gente rica,
de gente sem farrapos,
sem ranhos no nariz
e sem cara de fome...

Eu nunca pude brincar, senão nas poças de água dos lameiros,
enquanto era pequeno e pedia pelas portas como os outros garotos
e andava de calças rachadas...

Assim que fui maior,
assim que já tinha seis ou sete anos,
entrei, aos bofetões, para o trabalho!...

É por isso que eu tenho saudades
dos brinquedos
-daqueles brinquedos que nunca tive
e que brincaram sempre nos meus olhos
-com as meninas orfãs dos meus olhos
de garoto da rua...

Que bom! Que bom que deve ser
brincar
com bonecos de corda
e com bonecas que falam e que piscam os olhos
como gente viva...

Gostava tanto, tanto, ainda mesmo agora, de brincar
-agora que já sou homem
e que, embora pequeno, ganho o pão que como
e fumo
e digo palavrões,
quando a vida, ao passar, me pisa os pés descalços!...

Alfredo Reguengo
01/04/1946

Fomos muitos milhares



terça-feira, abril 18

Lista de preferências

Aí vai uma pequena provocação: Para a Lay, a semcantigas, a planície, a Helena, a





Lista de preferências

Alegrias, as vividas
Dores, as permitidas
Casos, os teus
Conselhos, os meus

Meninas, as minhas

Mulheres, as que souberes
Orgasmos, os que tiveres

Ódios, os de estimação
Domicílios, os de animação

Adeuses, os de evitar
Artes, sem as diferenciar
Professores, os de confiar
Prazeres, os de imaginar
Projectos, os a iniciar

Inimigos, os de jeito
Amigos, os de peito

Cor, ao gosto
Meses, o Agosto

Elementos, o Ar
Divindades,
a Einherjar

Vida, a vivida
Morte, a não sentida

Fernando Marques

Eu também vou lá estar.

Amanhã os trabalhadores da PT vão concentrar-se em frente ao parlamento, a protestar contra a OPA. Eu também vou lá estar. São quase mil quilómetros de viagem, mas nunca devemos abdicar de lutar, quando achamos que a luta é justa. E esta OPA não é boa para o país, nem para o serviço público de telecomunicações, nem para os consumidores e nem, em particular, para os trabalhadores do grupo PT.

Não vou repetir os meus argumentos contra a OPA.
Estão aqui e aqui, mais aqui e ainda aqui, mais aqui e aqui e ainda mais aqui e aqui e também aqui e ainda aqui e mais aqui e aqui .

Entretanto quem está a ganhar e muito com as OPA são os bancos que prestam assessoria e as financiam e os advogados e os consultores de comunicação que independentemente do sucesso da operação, já garantiram um lucro mínimo:

Segundo o DN de ontem, só os bancos em aconselhamento financeiros, vão ganhar na ordem dos 10 milhões de euros, sem contar ainda com os juros (spreed) sobre o financiamento e as sociedades de advogados, ganham mais de 200 mil euros em apoio jurídico.

E os accionistas, não ganham? Segundo o Jornal de Negócios, só com o aumento dos dividendos em 9 cêntimos, decidido pela Administração da PT, como resposta ao lançamento da OPA sobre a PT, os grandes accionistas de referência vão ganhar, tomem nota, a Telefónica, cerca de 10 milhões de euros, o BES, 8,4 milhões de euros, a CGD, 5,2 milhões, o Coronel Luís Silva, 2,6 milhões, o Patrick Monteiro, também mais de 2 milhões de euros.

Vendo bem, se calhar esta OPA não é tão “hostil”, para eles, como nos querem fazer crer. Desde já, está a dar-lhes muito dinheiro e só isso são motivos para sorrir. Já para os trabalhadores, pelo contrário, as coisas não estão bem, pois ainda não foram actualizados os vencimentos que deviam ter acontecido em Janeiro, sendo a proposta da Administração inferior a 2 por cento de aumento. Isto, após um ano de exercício em que a PT obteve os maiores lucros de sempre, cerca de mil milhões de euros.

Mas essa é outra luta, espera-se pois que os sindicatos não se deixem embalar nestes cantos de sereia.

Mas não pode ser isso, motivo para os trabalhadores e até a população, esmorecerem e deixarem de se manifestar contra a OPA. Nesta fase é importante que não haja distracções.

Defender a empresa contra o seu desmembramento, defender os postos de trabalho, defender o serviço público, assegurando que o Estado deve manter a sua capacidade de intervenção, defender os direitos sociais, como o fundo de pensões e os cuidados de saúde, é a prioridade e o resto não pode ser moeda de troca, quando os lucros foram fabulosos e ainda aumentaram mais os dividendos aos accionistas.

Este país não pode ser um casino em que tudo se joga e onde os ricos estão mais ricos, os pobres mais pobres, os lucros da banca e de outras grandes empresa são enormes e continua a haver batota fiscal.

Basta ver que com esta OPA e em consequência do empréstimo de Belmiro à banca, para financiar a operação, os lucros e os dividendos garantidos todos os anos pela PT, são livres de impostos que o Estado vai deixar de receber, até a Sonae liquidar a divida à banca, ou seja, o Estado prescinde de receber o dinheiro de impostos que vão ser utilizados para comprar a PT. São pelo menos 3 mil milhões de impostos que o Estado deixa de receber.

Outro aspecto, não menos importante a destacar é que os accionistas com mais de um ano de posse de acções, estão isentos de impostos das mais valias, o que significa que estão em causa cerca de 6 milhões de euros de ganhos livres de impostos. Um negócio chorudo para os ricos!

Por isso, também, deve ser apoiada a proposta legislativa do Bloco de Esquerda que pretende que os empréstimos contraídos para o financionamento de uma OPA não possam ser usados para deixar de pagar impostos, quando as empresas a presentarem lucros, assim como, obrigar a pagar impostos, as mais-valias das vendas das acções.


Um poema por dia de Alfredo Reguengo (VII)



Alfredo Reguengo era sem dúvida um poeta de intervenção.
Com a vitória dos Aliados, o discurso poético deixou cair o tom mais "agressivo" na forma, e tornou-se menos impulsivo e mais maduro. Segundo consta, Reguengo, tinha momentos em que escrevia vários poemas num dia e noutras ocasiões estava largos tempos sem escrever. O poema Viagem, é escrito em 12 de Setembro de 1963 e a temática desloca-se para os poemas de amor. Esta "Viagem" não se sabe se é uma metáfora, transfigurada em roupagem de mulher ou se será uma homenagem à companheira ou a mistura das duas. A sua ternura pela sua mulher está bem patente, na dedicatória deste livro " À Vivinha como a única coisa boa que a vida me deu", escrita pelo seu próprio punho.


Viagem

Se não vieres,
eu partirei
sozinho
pela estrada-de-noite
que se alonga
na planura
sem
fim.

Levarei nos meus olhos,
cansados
de esperar,
a tua imagem
-que ali ficou
à força de sonhada
-e ela será
a luz
que me há-de guiar
na noite
sem madrugada...

Partirei triste
-eu
sei-
por não teres chegado,
como tinhas dito
-e triste,
sobretudo
por ver
que não vieste
por não te merecer...

Mas o que ninguém consegue
é tirar
a tua imagem
dos meus olhos
deslumbrados!

Eu tenho-a,
viva,
lá dentro
e, para que ela não fuja,
hei-de levá-los... fechados!...

Alfredo Reguengo

segunda-feira, abril 17

Marcelo Rebelo de Sousa e o BE

Marcelo Rebelo de Sousa, MRS, dedicou especial eloquência ao Bloco de Esquerda. Se bem percebi, Marcelo compreende as intenções do Bloco de disputar a maioria social.

MRS compreende que o BE lance uma iniciativa como a “marcha pelo emprego” porque o emprego é uma questão estrutural na sociedade e é uma questão que diz respeito à maioria da população.

Equivoca-se quando diz que o BE se tem remetido às causas “comportamentais”, basta olhar o que foi a primeira campanha do BE – centrada no segredo bancário e na fiscalidade, e agora a última campanha presidencial – muito centrada no desemprego e na segurança social, com, talvez, o maior número de visitas a empresas de sempre.

MRS refere a não influência sindical do BE. A abordagem de MRS merece umas notas:

a) O BE não quer controlar movimentos sociais – entende que estes devem ser independentes e fortes. Os movimentos sociais não são correias de transmissão do partido – devem ser as vozes e as vontades dos seus próprios associados.

b) O BE não tem tendência sindical – expressa uma linha política de participação, democracia, cidadania e combate social aos trabalhadores. O BE não dá ordens aos seus militantes para que tomem determinadas opções sindicais.

c) O BE não faz concorrência interna – nomeadamente dentro da CGTP. Era aliás difícil – muitos sindicatos da CGTP têm estatutos tão bloqueados que parecem inspirados na UGT ou que visam perpetuar um único grupo político dirigente.

d) O BE não faz concorrência ao PCP. O PCP é um partido bloqueado. O BE é um partido movimento – essa MRS percebeu bem – um partido aberto, plural e democrático. O BE não pretende fazer uma afirmação ideológica dogmática encerrada num passado sem resgate, em derrotas sem questionamento. O socialismo é expressão de futuro, que se constrói numa luta plural e não numa verdade pré-definida.

e) O BE quer disputar o apoio de milhões de pessoas, muitas delas influenciadas e votantes do PS, de Manuel Alegre, de Mário Soares... o BE quer desmontar essa política de destruição do Estado social, a política de rendição do PS ao neoliberalismo e conquistar o apoio popular para a oposição a essa política.

f) O neoliberalismo é o nosso adversário. Cá, como na Europa, como no mundo. Isso MRS também sabe.

Victor Franco

Um poema por dia de Alfredo Reguengo (VI)



A linha poética de Alfredo Reguengo é como disse, muito cheia de sons. E espacialmente muita discursiva. Neste poema, a musicalidade de Alfredo Reguengo, sobressai. Esta poesia é extraordinária para ser dita em qualquer tertúlia, ao som de um piano ou de uma simples viola. Às palavras usadas com a força que é uma característica da sua poesia, junta-se aqui o "nervo" contra a linguagem bajuladora como “palavras cariciosas / que se roçam por mim”, brigando com outras mais sinestécias, como “o látego das pragas/ riscando azúleos traços sobre o meu corpo enfermo” ou nesta, mais musical, no “escuro do vosso silêncio”.

Janela Aberta Na Noite

Deixem-me! Deixem-me! Vocês não sabem o que eu tenho,
nem é preciso que o saibam!...

Quero, simplesmente, que me deixem entregue ao meu negrume
e que não me digam vazias palavras de consolação.

Não me perguntem o que tenho,
nem se interessem por mim.

Isto há-de passar quando quiser,
assim que o manto negro se fundir em manto de luar
e os meus olhos ensombrados
deixarem de se arrastar no asfalto repisado...

Deixem-me só!

Fere-me a doida mudez das palavras cariciosas
que se roçam por mim
e antes prefiro o látego das pragas
riscando azúleos traços sobre o meu corpo enfermo
e rebentando as cordas da harpa eólia dos meus nervos
sem domínio!...

Que o escuro do vosso silêncio
caia sobre o escuro em que me afundo,
até que tudo seja negro-negro
como o negro chapéu da noite mais fechada!...

Deixem-me! Deixem-me sozinho
com a minha loucura a embrulhar-me,
que o Sol há-de chegar
- ... talvez na hora que vem...

Alfredo Reguengo