quarta-feira, abril 12

Um poema por dia de Alfredo Reguengo ( I )

O meu relógio não é um moinho a engolir as horas
-as horas que já foram
e que são.
-Não!
O meu relógio trabalha como os outros,
mas só tem uma hora
-a hora que há-de vir!...

Alfredo Reguengo

A partir de hoje e até ao 25 de Abril, irei publicar um poema por dia de Alfredo Reguengo, do livro “Poemas da Resistência” que me foi oferecido gentilmente pelo Sr. Presidente da Junta de Freguesia da Meadela, a quem Alfredo Reguengo legou toda a sua biblioteca pessoal. Este livro atravessa o período entre 1937 e Abril de 1974. Não conheci Alfredo Reguengo, pessoalmente. Retenho apenas uma muita vaga ideia dele, julgo que tinha um pequeno comércio de mercearia, ou sapataria, na rua Gago Coutinho, em Viana do Castelo. Não tenho a certeza pelo que esta informação vai com todas as reservas. Mas aquela figura esguia, simpática, mas, intensamente, introspectiva, não me deve enganar.

[1] Alfredo Reguengo era um homem, atento à actualidade e preocupado. O seu primeiro livro, “Poema dos 20 anos”, foi publicado muito cedo e o primeiro bloco de poemas da resistência, sob o pseudónimo de Julião Ricardo, foi composto entre 1937 e 1941, no período mais duro da repressão Salazarista e após a vitória franquista, na guerra civil da vizinha Espanha e no melhor período do III Reich.

Os seus escritos não poderiam, sendo ele um homem da resistência, de ser marcados por esses tempos de guerras. Eram contudo muito intimistas, voltados para o despertar de consciências, a união de esforços. “Irmão” ou “Multidão”eram palavras muito usadas, para designar o seu povo e os chamar ao combate contra a opressão.

Esta colectânea de poemas da resistência, perpassa depois a vitória dos aliados e o seu discurso é mais poético, menos impulsivo e os temas são mais a preocupação pelo social, o quotidiano, a luta por uma vida melhor, as referências aos trabalhadores, aos pescadores, às condições de vida. Mais tarde, com a desilusão a fazer-se sentir, atravessa uma fase de pessimismo, depois de ter passado pela prisão fascista, e a sua poesia é mais de desilusão, de amargura, era uma fase mais reflectiva, mais solitária, mais romântica, mais sem abandonar nunca a esperança e a sua veia de lutador.

Como homem comunista, o fervor revolucionário solta-se com a reorganização do Partido no VI congresso e em particular com o relatório, Rumo à Vitória, de Álvaro Cunhal. O pessimismo desaparece e dá lugar a uma nova poesia mais interventiva, a alargar a sua acção à comunicação social escrita com a publicação de textos, no Jornal Aurora do Lima, que o levam novamente à prisão. Com a primavera marcelista, não deixa de lutar mas a sua poesia torna-se menos “politica” e depressa regressa a desilusão, a solidão, o ruir de mitos, e até o desejo da morte. Os seus temas são agora mais neo-realistas, mas mantendo sempre presente no sua poesia o toque do agitador, do inconformista.

A linha poética de Reguengo, sugere muito José Gomes Ferreira, Antero (que Reguengo bem conhecia); António Nobre, Augusto Gil ou José Régio. Mas acima de tudo a sua poesia é muito própria, o verso curto, incisivo, nervoso, aliada a um tom sereno, feito de convicções e de generosidade, sugerindo uma musicalidade muito marcada.

[1] Esta parte de texto foi feita com base no prefácio ao livro, Poemas da Resistência, da autoria de Alberto Antunes de Abreu.

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