quarta-feira, março 15

A menina, a China e os dramas sociais

Ela ainda tem cara de menina, Cristina Casalinho é economista-chefe do BPI e escreve hoje, 2006-03-15, no suplemento de economia do DN.

Em “Lições da China” Cristina Casalinho cita a análise de um economista chinês radicado no EUA, publicada no Financial Times, para referenciar que “as autoridades puseram em marcha um corajoso programa de liberalização económica e reformas institucionais fundamentais, criando um ambiente competitivo que alimentou a iniciativa privada”.

Vale a pena olhar para essa liberalização que apagou o pretenso farol do socialismo. Um olhar sobre a China vale a pena por dois motivos: o primeiro para tornar mais clara a diferença “cultural” e ideológica entre os que se reclamam do comunismo, a segunda para tornar mais clara que a luta dos povos só com eles mesmo pode contar e que a China só é farol do capitalismo selvagem. Os números que a pouco e pouco se tornam públicos dão conta de um incomensurável drama humano.

“Em Abril de 2000, cerca de 80% dos 6 mil milhões de yuan depositados nos bancos pertenciam a 20% da população[1]”. O jornal Público, 06/03/06,[2] dá conta de que “a desigualdade de rendimentos aumentou pelo menos 50% desde os finais dos anos 70, tornando a China uma das sociedades mais desigualitárias do mundo. Menos de 1% dos chineses controlam mais de 60% da riqueza do país”. “Na China moderna, nunca houve, provavelmente, um tempo tão bom para os capitalistas, comentou a revista americana Forbes”[3]. No que deu razão a Deng Xiaoping[4], um ideólogo da “Reforma e Abertura. Socialismo não é pobreza, enriquecer é glorioso”[5]. Indagados, alguns primeiros secretários do Partido Comunista responderam "não me meto em política". Outros primeiros secretários empenham-se nela activamente - até são capitalistas premiados como exemplo de trabalho.

Os dramas de exclusão social, de pobreza, de repressão, de violação dos direitos humanos mais elementares, na China, multiplicam-se por dezenas, centenas de milhares e milhões. Segundo dados da Human Rights in China (HRIC)[6] “310.000 é o número oficial de pessoas em "detenção administrativa", sem culpa formada ou julgamento, nos chamados "campos de reeducação pelo trabalho". Inclui sindicalistas, cristãos, dissidentes, internautas, tibetanos, uigurs. 100.000 membros da Falungong estão em campos, ou em asilos psiquiátricos. Oito mil terão morrido nas mãos da polícia. 80% de todas as execuções do mundo realizam-se na China”.
Os despedimentos das empresas estatais abrangem milhões de pessoas. 6.000 mineiros morreram em trabalho no ano 2004. 80% dos trabalhadores privados não têm contrato de trabalho.

E mais não digo.
A China é o farol do capitalismo. Com pavilhão na festa do Avante.

Victor Franco

[1] CAEIRO, António, Pela China dentro, D. Quichote, 2004, pág. 211
[2] Citando um extenso artigo de Mixin Pei, em www.foreignpolicy.com
[3] www.forbes.com
[4] 1904 – 1997, um dos principais dirigentes do PCChinês e do Estado
[5] CAEIRO, António, Pela China dentro, D. Quichote, 2004, pág. 63
[6] “Os Números das Violações Aos Direitos Humanos na China”, Público, 27/01/04

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