quinta-feira, julho 20

à esquerda

Sou um idealista e um utópico, reconheço, algo ingénuo, também. Muito crédulo nas pessoas. Confio em demasia. Os meus amigos sabem bem que é assim. Estou onde estou por acreditar. Não por desejos escondidos. Quando estou, estou no sítio “certo”, porque estou de boa-fé e as pessoas merecem a minha confiança.

Agora estou no Bloco de Esquerda. Sou membro da Assembleia Municipal. Não tenho outros cargos políticos. Não quis pertencer à coordenadora e ao secretariado. Pedi um tempo aos meus companheiros. Não quis assumir postos de direccção. As eleições acabaram por não se realizar ainda, por decisão dos companheiros. Em Setembro terei de tomar opções, pessoais e políticas. Poderá passar, por um envolvimento maior, na estrutura interna e um "apagamento" mais público. Ou, simplesmente, remeter-me à condição de simples aderente que vai colaborando, caso a caso.

Há muitos anos que venho defendendo uma “esquerda unida”. Uma esquerda, sem tabus, descomprometida, séria, organizada em plataformas de denominadores comuns. Se a direita é capaz, a esquerda tem de ser capaz, também.

Defendo essa esquerda à escala europeia. Não temos de estar de acordo em tudo ou até em parte substancial.
Apenas nos valores que são transversais a toda a esquerda. Esses têm de prevalecer. Uma esquerda social, humanista, solidária.

Uma esquerda exigente com os problemas do emprego, das desigualdades, das injustiças, da dignidade humana. Uma esquerda que recusa a guerra, a globalização neoliberal. Uma esquerda do mundo pobre.

Uma esquerda responsável, moderna, sem preconceitos.

Não recuso a globalização, as novas tecnologias, o avanço científico. Não me assusta.

Podemos ganhar em conhecimento, em qualidade de vida, em melhores condições para todos. Assim, saibamos travar os ímpetos de algum capitalismo selvagem. Dos senhores da guerra e das grandes potências.

Temos de confiar nas nossas capacidades. Num povo mais culto. Haverá sempre resistência a quaisquer tentativas de dominação, humilhação e esmagamento dos anseios de um povo que apenas quer ser feliz e ter as condições exigíveis para uma vida digna.

Estes meus sonhos sofrem muitos reveses. Quando leio ou ouço, alguns perfeitos disparates ou vejo certas práticas políticas. Que não se alteram. Que se mantêm fiéis a princípios sectários e dogmáticos que deveriam estar completamente arredados. Por este blogue nos últimos dias, cerca de uma centena de comentários, surgiram em réplica a dois artigos, um sobre o Aborto e a posição do PC e um outro sobre a reunião dos partidos que formam, ou estão presentes, como observadores, o Partido da Esquerda Europeia.

O primeiro era muito crítico para com o PC, por causa da guerra aberta com o Bloco sobre o seu posicionamento sobre o aborto. Achei que era falacioso e muito negativo e prejudicial à causa. É estar a inventar adversários. Foram muito más as posições públicas do PC e de alguns dos seus mais altos dirigentes.

Por aqui, alguns militantes, em particular, uma "denominada" Margarida, reage à bruta e com má criação, o que já é um costume, por todos os sítios onde tem passado e o seu partido é criticado, legitimamente, como são outros.

É nestas alturas que o meu idealismo tem um quebranto.

Tantos anos volvidos e os sectarismos perduram. Confesso que conheço bem as práticas do PC, em especial nos sindicatos. Como conheço as posições políticas. Sou um profundo discordante. Nas questões políticas, o PC parou no tempo. Hoje é um partido conservador e nacionalista.

Na maioria dos sindicatos, uniões sindicais, federações e confederações ou comissões, sindicais, de trabalhadores, por aí, as práticas de trabalho, a democracia sindical, os insultos, as calúnias, aos opositores, são uma constante e absolutamente não recomendáveis. Falta-lhes visão estratégica.

O PC tem um passado antifascista que honra todos os verdadeiros democratas. O PC não se cansa de repetir e a história, também não mente. Pelo PC passaram grandes figuras da resistência. Uns ainda lá estão, outros, muitos outros, saíram ou estão em processos de saída. Mas a luta de resistência ao fascismo não é património do PC (hoje nem sequer o seu secretário-geral é uma referência claro do antifascismo).

Muitos outros, resistentes antifascistas, saídos do PC, muito antes do 25 de Abril, também se organizaram em partidos e se opuseram ao fascismo. Outros fizeram-no fora dos partidos. Também foram presos e torturados.

A luta antifascista é património de um povo. Pela luta antifascista e pelas liberdades, foram torturados e morreu muita gente.

Alguém presumir-se como proprietário dessa luta ou erguer essa bandeira para atacar outros é injusto e não é verdadeiro. O património do PC e das suas lutas, para o bem e para o mal, é de todos os comunistas ou democratas que por lá passaram.

O PC, não é o meu partido, nunca o foi, mas podia ter sido, andei lá perto. Acabei por ir para a uma organização (M-L) de nome OCMLP que viria juntamente com outras organizações (M-L) a dar origem à UDP.

Estive lá ainda uns anos largos. Um dia, nos anos oitenta saí. Percebi que aquele caminho era estreito, muito fechado, com os mesmos defeitos, sectários e dogmáticos do PC. Perfilhando ideias e práticas parecidas.

Era um PC pequeno a disputar o terreno ao PC mãe, com as mesmas armas, o mesmo tipo de organização, com a mesma visão de Estado. Apenas mais pequeno e com uma linguagem mais radical. Deixou de ser o meu partido, um dia, depois de discussões impossíveis.

Abandonei-o depois numa conferência regional, em Viana, onde o então deputado, Acácio Barreiros, pretendia que eu retirasse uma moção, critica da actuação do partido.

Nunca deixei, contudo, de acompanhar o percurso e as discussões que se iam fazendo nessa área politica. A discussão interna na UDP, muitos anos depois, teve resultados, com a ascensão de Luís Fazenda a secretário-geral. Com Luís Fazenda, Pedro Soares e outros que desconheço a UDP, percebeu que a estratégia estava errada. Como errados eram certos conceitos de organização e da ideologia. Estes companheiros mudaram o rumo interno. Como outros que já tinham deixada a militância partidária. Como aconteceu com outras organizações políticas que viriam a formar o Bloco de Esquerda.

O Bloco foi e é ainda, o fenómeno político mais relevante dos últimos anos. Os partidos, assumidamente, puseram-se em causa. E encetaram um novo processo de reconstrução da esquerda. Sem dogmas, sem constrangimentos, sem complexos, sem preconceitos, aberto, em que tudo pudesse ser questionado e discutido. Sem uma ideologia definida. Apenas a vontade de construir uma plataformas das esquerdas. E repensar que esquerda se queria. É uma discussão ainda e sempre em aberto.

Com lealdade, sem estigmas do passado, discutir os caminhos que se colocavam a uma esquerda nova, para recuperar a esquerda social, a esquerda política, a confiança e a credibilidade dos cidadãos nos políticos e na política.

Foi isso que me trouxe ao Bloco. Com reservas iniciais, com dúvidas ainda agora, mas com a faculdade de discutir tudo e não estar agarrado a uma posição oficial.

O Bloco fez crescer a esquerda. O PC nestes oito, nove anos do Bloco, aguentou-se e nos últimos até recuperou algum eleitorado. A esquerda dos 8 por cento do PC passou a ter mais 6 por cento do Bloco. Os dez ou doze deputados do PC passaram a estar acompanhados de mais oito do Bloco.

O PC não perdeu. O Bloco ganhou. Os deputados que o Bloco recuperou foram os que o PC tinha vindo a perder desde as primeiras eleições. Não consigo perceber os medos do PC. Os ódios ao Bloco. O PC continua agarrado ao passado. Ao centralismo-democrático que tanto mal causou aos povos. Ao conservadorismo. A um nacionalismo bacoco. O PC deixou à muito de ser uma esperança de renovação. O PC mais do que um partido corre o risco de vir a ser um sindicato.

Espero que o Bloco continue por o caminho que encetou, sem se desviar um milimetro.
Não é fácil.

Gostava que o PC estivesse junto neste projecto, ambicioso, de construção de um Partido da Esquerda Europeia.

Gostava de ter um partido de Esquerda no poder, enfim.


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