quarta-feira, janeiro 25

Um balanço das presidenciais (1)

Cavaco Silva ganhou as eleições presidenciais e com ele toda a direita. A esquerda, toda a esquerda, perdeu. Alegre, apesar dos bons resultados pessoais, também perdeu. Manuel Alegre na noite das eleições, disse que estava solidário. Devia ter dito que perdeu. Como disseram todos os outros. Ninguém pode ficar de fora na esquerda. A esquerda perdeu porque o único adversário da esquerda era Cavaco Silva e ele ganhou.

Tenho lido e ouvido por aí muitas análises e reflexões sobre o resultado das eleições. Análise há “treinador de bancada”. Todos temos a nossa explicação para o resultado.

O desfecho, não fugiu, às minhas previsões, mais coisa menos coisa. Na primeira volta ou na segunda, mais voto, menos voto neste ou naquele candidato, mas Cavaco Silva iria ganhar as eleições, era a minha profunda convicção. A primeira conclusão que retiro destas eleições é que a esquerda não é maioritária no País. A esquerda como eu a vejo. Uma esquerda plural, mas a esquerda. A soma de todas estas esquerdas é minoritária. Não há maioria política e social de esquerda A esquerda vota à esquerda. A esquerda votou e não ganhou. O povo de esquerda tinha candidatos, para todos os gostos. Não pode ser desculpa dizer que nenhum agradava. O leque era assaz largo para escolher um candidato que condissesse com os nossos propósitos. E a esquerda compareceu e perdeu. Quem vota Cavaco Silva, seguramente, não é de esquerda. A prova está feita.

Cavaco Silva vence por mérito estas eleições, através de uma estratégia pensada ao pormenor. A retirada da cena política nos últimos dez anos, gerindo as palavras e os silêncios, foi estudada e cuidada. Uma meticulosa encenação messiânica, foi aplicada e desenvolvida pelos seus correligionários, colocados em pontos estratégicos, sendo a comunicação social estratégica nesta arquitectura de um candidato. Os que conceberam a candidatura, criaram a figura do homem providencial, o homem que vai guiar o País na senda da prosperidade, da tranquilidade e que vai resolver os problemas e as dificuldades do País.

Mas, Cavaco Silva vence, também, por inépcia do Partido Socialista. A direcção do PS geriu de forma confusa e ambígua todo o processo de escolha do seu candidato, desde o início. Nunca se percebeu qual a estratégia de Sócrates. Podemos especular sobre o assunto. Houve quem visse, em todo este processo, tramas, conspirações, traições, astuciosamente engendrados, para levar à eleição de Cavaco. Nunca se saberá.

Cavaco, em consequência destas duas razões, aproveita, habilmente, o descontentamento das políticas anti-sociais e a perda de confiança, amplamente depositada no Governo Sócrates nas eleições legislativas de Fevereiro. Basta ver que o PS nas legislativas de Fevereiro de 2005 obteve 45 por cento e agora com os candidatos da área socialista Alegre e Soares, obtém 35 por cento. Estes resultados comparados, permitem verificar que parte destes 10 por cento se deslocou para Cavaco. Foi esta grande massa de votantes, que ora dão a vitória ao PS ora ao PSD, que nestas eleições resolveram dar a vitória a Cavaco Silva.

O Governo é outro dos grandes culpados. O seu principal contributo é a insensibilidade social que desde o início, deu testemunho. Não bastando ter aprovado das medidas mais gravosas de que há memória, como o aumento da idade da reforma, a retirada de direitos sociais, o Governo em plena campanha “esquece” que tem um candidato e “entrega o ouro ao bandido”, ao tomar mais medidas impopulares como o aumento dos combustíveis, dos transportes públicos, ao fechar centros de saúde ou ao apresentar propostas de aumentos salariais que baixam o salário real, tudo isto como se lhe fosse indiferente o resultado das eleições ou desse como adquirido ou até desejável (na linha da teoria da maquinação maquiavélica), a vitória de Cavaco Silva.

Inimaginável!

Manuel Alegre é apenas um vencedor virtual. O seu mérito reside apenas em ter percebido, a tempo, a conjuntura política: A de um governo desgastado e desacreditado, na sua base social de apoio e na população em geral; a escolha errada do candidato do Partido Socialista, sentenciado desde a primeira hora a uma derrota anunciada; a percepção do descrédito dos políticos e partidos, em que os maltratados ou os favorecidos, são sempre os mesmos; a divisão na esquerda; um estatuto de homem contumaz e de pose justicialista.

E assim, de repente o homem de sempre dos aparelhos partidários, o indefectível apoiante das políticas de todos os governos socialistas, o político que apoia o orçamento/negócio do “queijo limiano” de Campelo, que aprova as medidas anti-sociais de Sócrates, que pede encarecidamente o apoio partidário à sua candidatura, aparece como o paladino dos direitos de cidadania, com dissertações fogosas, contra tudo aquilo que sempre foi, durante trinta anos, de um ressentido, ferido por não ser a escolha do seu partido.

O resto foi o que se viu. Um jogo político baixo, tacticista, de jogador “pequeno”, como a campanha eleitoral evidenciou. Frases batidas até à exaustão, um discurso nacionalista aplaudido pela direita e um silêncio cúmplice nos ataques indecentes de que Soares foi alvo. Uma campanha eleitoral de vaidade, de homenagens narcísicas ao seu passado, de pouco esclarecimento, poucas ideias, debates frágeis, ataques caluniosos a outros candidatos da esquerda e uma complacência com a candidatura de Cavaco Silva.

Tudo junto, deu uma enorme “salada russa” e uma prestação demagógica e falsa que seduziu a direita, conquistou parte do eleitorado socialista e de outros eleitores de esquerda que face ao quadro de candidatos, acharam ser o melhor colocado para derrotar Cavaco e dar uma canelada a Soares.

A outra grande mentira trata-se de dizer que este é um movimento da cidadania. Não é verdade. A cidadania pratica-se e manifesta-se quotidianamente. Nas comissões de bairro, nas comissões de moradores, nas associações culturais, cientificas, ambientais, sindicais, nos movimentos sociais, na prática assertiva, exigente, no combate pelo direito e a justiça. Os mais de um milhão de eleitores que votaram Alegre votaram nele por razões conjunturais. Os movimentos de cidadania não são isto, são muito mais. São combate de todos os dias, são presente e são futuro, são luta e não acomodamento, são integração e não contemplação, são concretos e definidos. Alegre pela sua natureza, nunca será o mentor ou líder de um movimento com este espírito.

(Só agora vem o meu balanço. Na 2ª feira, fiquei "doente", não saí de casa e não quis saber de nada. Depois não tive tempo. Inicio agora e devo concluir amanhã)


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